terça-feira, 13 de agosto de 2013

O CASO

O aluno Ítalo é um menino de 11 anos, matriculado no Ensino Fundamental II no Centro Educacional João de Souza Oliveira (CEJSO), próximo a sua residência no município de Várzea Nova-BA. A turma que frequenta no ensino regular (6º ano matutino) está em sua mesma faixa etária, muitos dos alunos são seus colegas desde o maternal. Seus sentimentos de alegria ou tristeza são veiculados e reconhecidos através de sua expressão facial. O mesmo permanece quase a totalidade de seu tempo diário numa cadeira de rodas específica para sua deficiência e idade. Convive com seus pais e um irmão caçula e gosta, como toda criança de sua idade, de assistir televisão, vídeo game e outros jogos de computador. Os quais joga com o auxílio de outra pessoa, pois não possui coordenação motora para segurar objetos. Na escola assiste às aulas na cadeira de rodas sendo acompanhado por uma auxiliar. Seus colegas já estão habituados com sua convivência e assumem uma postura de colaboração em relação ao mesmo. A paralisia cerebral que acomete Ítalo foi detectada nos seus primeiros meses de vida. Após uma série de diligência em unidades de saúde e hospitais, seus pais foram orientados a procurar auxílio no Hospital Sarah Kubitschek (Especializado) em Salvador. Onde foi diagnosticada a paralisia cerebral em decorrência de complicações no parto, que interrompeu temporariamente o suprimento de oxigênio ao cérebro causando neste, lesões que resultaram na referida paralisia, afetando assim todo o seu aparelho locomotor, mas, mantendo intactas as funções cognitivas. Segundo o Código Internacional de Doenças, edição n.10 (CID-10) a paralisia cerebral que acomete Ítalo é codificada pela sigla F83 que refere-se aos “Transtornos específicos mistos do desenvolvimento” os quais afetam “o desenvolvimento da fala e da linguagem, das habilidades escolares e das funções motoras, mas sem que nenhum desses elementos predomine suficientemente para constituir o diagnóstico principal.” segundo o mesmo CID-10. Até a idade de 04 anos era relativamente frequente sua internação no referido hospital por um período de aproximadamente 30 dias para a realização de acompanhamento e outras intervenções. Atualmente o mesmo frequenta esse mesmo hospital apenas uma vêz ao ano para avaliação por equipe multidisciplinar com o objetivo de acompanhar e monitorar seu desenvolvimento motor, físico, cognotivo e psicológico. No primeiro semestre de 2011 Ítalo recebeu do Hospital Sarah Kubitschek um programa de computador denomiado Programa de Comunicação Alternativa que após instalado no computador da Sala de Recursos possibilitou ao mesmo a realização (com o auxílio da professora da sala de recursos) de operações na máquina, com um auxílio de um mouse especialmente adaptado para ser acionado com o lado direito posterior (parte de trás) de sua cabeça, quando posicionado no lado direito do encosto para a cabeça da cadeira de rodas. A comunicação de Ítalo se dá pela expressão facial, movimento dos olhos para a direita e esquerada e das pálpebras, esses – juntamente com o movimento lateral da cabeça para a direita - são os únicos que Ítalo consegue coordenar. Por isso, são poucas as pessoas com as quais ele consegue se comunicar, pois são poucos os que entendem esses seus códigos de comunicação (exemplo: após lhe fazer uma pergunta que tem como resposta um “sim” ou um “não”, o “sim” é dado por uma forte e nítida piscada das palpebras; o “não”, se traduz pelo movimento lateral dos olhos, ele olha para um lado e para outro de forma regular e determinada). A vista deste aspecto na comunicação, é frequente – em alguns momentos – Ítalo demonstrar irritabilidade e angústia (através das expressões faciais) por não ser compreendido de forma rápida e precisa pelos seus interlocutores. Apesar disso, o mesmo entende e interpreta todas as perguntas e outras comunicações que lhe são dirigidas. O Programa de Comunicação Alternativa irá ampliar seu leque de recursos para se comunicar com os outros, pois permite que o mesmo emita respostas mais complexas e completas. O já citado cientista Stephen Hawking se utiliza de um computador acoplado à sua cadeira de rodas com um programa similar. Ítalo esta em fase de treinamento com este programa e já escreve algumas palavras com o auxílio do computador e de sua professora de educação especial. RELAÇÕES ENTRE O CASO DE ÍTALO E OS AVANÇOS NA POLÍTICA DE EDUCAÇÃO INCLUSIVA No ano de 2003, Ítalo foi matriculada em uma escola de educação infantil particular, tal matrícula foi garantida por lei (Educação Inclusiva nas Escolas da rede Privada). A Lei 7.853/89 em seu art. 8º, inciso I considera crime a negação de matrícula de deficientes sem justa causa. Assim, Ítalo iniciou sua inclusão social através do contato com outras crianças de sua mesma faixa etária. Seus pais mantinham também uma pessoa que estava sempre próximo a Ítalo para maiores cuidados quando necessário. Quando completou 07 anos de idade ingressou numa escola pública municipal, momento no qual começaram a surgir impedimentos e barreiras para sua educação e convivência social. Sem ter mais alguém para cuidar de suas necessidades imediatas, e sem ter sua professora uma formação e orientação específica para seu caso, Ítalo começou a ficar sem a devida assistência em certos momentos na escola, como na hora do intervalo, por exemplo, quando sua mãe levava seu lanche e percebia que neste momento o mesmo ficava sozinho e sem nenhuma assistência na sala de aula. Em vista disso, sua mãe solicitou a transferência do mesmo para uma turma na qual a mesma (sua mãe) era a professora, pois ela fazia (e ainda hoje faz) parte do quadro de professores do município. Apesar disso a mesma sentiu também dificuldades em educar seu próprio filho em sala de aula, pois lhe faltava suporte pedagógico e assistência institucional neste sentido. Já era o ano de 2007, desde o ano de 2001 as políticas públicas voltadas para as pessoas com deficiência estava em franca expansão. Dentre os avanços nesta área, desde 2001 quando Ítalo já estava em seu primeiro ano de vida, surgiu o Decreto n.3.956/01 (Convenção da Guatemala), propondo “a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Pessoas Portadoras de Deficiência”, resolvendo questões hermenêuticas de normas da LDB pertinentes ao caso e que antes desfavorecia as pessoas com deficiência; a criação da Lei 10.172 no mesmo ano, que aprovou a Plano Nacional de Educação (PNE) com 27 metas e objetivos para a educação de alunos especiais, além de outros decretos,leis pareceres e resoluções que criavam e /ou aperfeiçoavam direitos relativos às pessoas com deficiência, sobretudo na área educacional. Ainda assim, no ano seguinte, sua nova professora não aceitou tê-lo como aluno, pois não se conformava com a complexa situação de ter um aluno com necessidades educacionais especiais em sala de aula, frente ao seu despreparo para a situação que ora se apresentava. Apesar da recusa da professora, Ítalos tinha direitos adquiridos pelos últimos avanços nas políticas inclusivas e sua mãe iniciou uma árdua campanha de esclarecimento acerca destas mesmas políticas, traduzidas pelas normas já vistas. Pois, o distanciamento da cidade de Várzea Nova dos grandes centros dificultava, de certa forma, a instrução e o esclarecimento dos profissionais de educação acerca dos últimos avanços na área de educação inclusiva. De acordo com as leis e normas inclusivas, Ítalo tinha o direito de ser aceito, respeitado, compreendido e tratado com dignidade e atenção por todos os atores da escola, desde seus colegas aos seus professores, passando por todos os outros funcionários da instituição, assim como eram tratados também todos os outros alunos. De outro lado, compreendia-se a situação da professora, pois para a mesma se descortinava uma nova e desconhecida realidade até então, naquele pequeno município. A mesma temia não corresponder às expectativas dos pais e das necessidades educacionais especiais do próprio Ítalo, além de seu despreparo para lidar com uma situação ao mesmo tempo tão emergente e premente. Havia procedência lógica na angústia da educadora de Ítalo, mas não o direito de recusá-lo.Porém, desde 2005 o MEC lançou o programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade que objetivava formar educadores e gestores visando tornar os sistemas educacionais mais inclusivos garantindo o direito de permanência e acesso, com qualidade e dignidade, de alunos com necessidades educacionais especiais em estabelecimentos regulares de ensino. Entretanto, o município de Várzea Nova ainda não tinha sido contemplado com este programa à época (2008). No entanto, após devidamente esclarecida, a referida professora reconheceu sua falha e terminou por acatar o que as normas orientavam em relação a Ítalo, apesar de ter uma sala com superlotação, falta de uma cuidadora educacional e outras carências como falta de formação continuada, ausência de apoio pedagógico e de órgãos públicos competentes, porém inativos para o caso. Apesar de todas as barreiras que se opunham à situação, o corpo docente - inclusive também o discente, representado pelos colegas de classe - envolvidos com o caso de Ítalo, acabou por se sensibilizar com o mesmo, e descobriram, através de um esforço conjunto, que é possível atender aqueles que são acometidos por necessidades educacionais especiais. Neste esforço de toda comunidade da escola em prol do acolhimento e inclusão de Ítalo, o apoio de sua mãe como intérprete de sua comunicação e mediadora entre a equipe multidisciplinar do Hospital Sarah Kubitschek e a escola foi de fundamental importância para o sucesso de seu acolhimento na instituição de ensino. No ano de 2010, Ítalo foi matriculado no atendimento educacional especializado (AEE), se utilizando o direito que lhe foi conferido pelo Decreto n.6.571/2008 que – como já visto – dispõe sobre o AEE. Inserido no contexto do mesmo AEE o foco principal de sua aprendizagem se deu em torno da comunicação alternativa (C.A.) através do já citado programa de computador e outros recursos similares, porém de mais baixa tecnologia e nem por isso menos eficiente dentro de certos limites, mas sempre de forma assistida pela sua professora de AEE. O desafio maior, entretanto, é ampliar seu leque de recursos para se comunicar com colegas e professores e aumentar a rapidez de sua capacidade comunicativa. Haja visto a demanda de aprendizagem das nove disciplinas curriculares e a comunicação funcional que as mesmas exigem, inclusive, numa participação mais efetiva nas diversas atividades desenvolvidas em sala de aula e na escola. OS RESULTADOS OBTIDOS NO CASO ÍTALO FRENTE AOS AVANÇOS NA POLÍTICA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA Os resultados observados com os cuidados e a atenção dispensada a Ítalo, por efeito de todos os avanços legais conquistados na política de educação inclusiva são evidentes. O mesmo já se faz compreendido e compreende o mundo e a sociedade à sua volta. Sua professora de AEE já auferiu através de avaliações específicas, atividades e estratégias diversas - aprendidas em sua especialização (também prevista nas citadas políticas) – que o nível de aprendizagem de Ítalo está condizente para o ano/série em que está inserido, demonstrando o mesmo motivação, aprendizagem significativa e afinidade pela escola. Se não fosse as leis que versão sobre a inclusão, Ítalo – e milhares em condições similares – poderia estar relegado ao desprezo e à indiferença da esmagadora maioria da sociedade. Pois haveria uma barreira quase intransponível de comunicação entre Ítalo e o mundo que impediria de evidenciar suas reais possibilidades de aprendizagem e interação. Desta forma, o AEE se mostra como um instrumento de fundamental importância para complementar as necessidades educacionais especiais de Ítalo, possibilitando sua inclusão na sala de aula, na escola e na sociedade como um todo. E, colocando em evidência a realidade de suas competências e habilidades – ainda que limitadas pela paralisia cerebral – mas nem por isso excluídas do âmbito social. Sua capacidade, entretanto, está estreitamente vinculada aos recursos da tecnologia assistida de acessibilidade à informática, à comunicação alternativa e demais recursos. É válido lembrar que todos este “arsenal” de inclusão está previsto nas já citadas leis voltadas à educação inclusiva. Autor: Marques Magalhães Colaboradora: Sílvia Carneiro

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